sábado, 11 de abril de 2020

POVOADO SÃO MIGUEL DE NOVA SOURE

Vista aérea do centro do Povoado São Miguel atualmente: fotografo desconhecido.

[Como se forma uma comunidade? Quais os processos que passa um determinado local até chegar no status de comunidade? Nessa publicação vamos explicar através de relatos de um dos moradores nativos como surgiu a Comunidade do São Miguel.]


Diálogo com Tio Dorgival de Oliveira  

"...Só sei que quando eu fui tentar adquirir, tinha acabado de chegar de São Paulo [mais esperto] e fui saber como é que conseguiria comprar essa fazenda, porque a fazenda tem rio dentro aí me informaram que não tinha condições porque ela foi retirada de um e entregue a outro, por abandono, que não tinha jeito, principalmente hoje, aí aqueles documentos que eles adquiriram naqueles tempos naqueles cartórios eles grilavam1, iam no cartório davam dinheiro pro escrivão, não tem boca não2É mais fácil conseguir a de Portugal do que a daqui, porque a de Portugal está lá e  sabendo que tem o museu no Porto, com certeza tem riquezas em ouro e tudo mais, era o que pai dizia, aí um dia eu perguntei, por que seu pai não foi lá? Então ele respondeu não, é que na época nós tínhamos a notícia pela gazeta3 e não podia ir porque estava em guerra civil. Teve essa guerra civil em Portugal? Deve ter sido! Aquela briga territorial entre Portugal e Espanha. Teve a guerra da Espanha com o Brasil, quando os espanhóis foram expulsos. 
Em relação a povoação do São Miguel tinham duas casas, a casa da fazenda que estava de pé, tinha o finado Virgílio (pai do finado Silú) e o povo da finada Lira. Depois foi chegando o resto do povo. 
[Essa história de Antônio Gago que dizia que quando morava aqui e depois foi chegando o povo do finado Elizeu?] 
Não! Quem morava ali era o pai de Silú, finado Virgílio. E aí  existia a fazenda e a estrada que descia para a Quixabeirinha encostado a Maurício (pai do conhecido comerciante local Antônio Gelado) tudo era cerca da antiga fazenda, a cerca passava ali encostada na guia da igreja e aqui só tinha uma casa que eu lembro que era a casa do finado Virgílio e a casa da finada Lira lá pra baixo o resto era tudo tronco velho encostado onde hoje é o Povoado do Beré, antigamente chamavam de Tronco Velho da Caatinga de Cheiro, aí era a divisa da fazenda. Aí vô Elizeu comprou todas essas terras da fazenda onde hoje tem os terrenos que pertencem aos filhos. Tudo isso foi comprado a Bentiví, só que essas terras descendo aqui , só que o limite não era essa estrada aqui, o limite era lá na Roça do Estado como era conhecida. Jurití pertencia ao Campo Frio, Fazenda Campo Frio e das mangueiras (atual fazenda de Elizeu no Tanque Novo) por exemplo do lado de cá  pertenciam ao Estado, então tudo que tem pra cá do Tanque Novo até o São Miguel pertenciam ao estado, na época um posseiro só podia ter uma terra no caso uma fazenda não importando o tamanho, então Bentiví optou por lá porque os terrenos eram melhores, aqui só tinha formiga e Saruê4então ele devia um dinheiro a pai (Elizeu) aí pai cobrou e ele disse que só se ele ficasse com a fazenda! Mas a realidade é outra, depois eu descobri que na verdade ele ofereceu a fazenda porque não podia ficar com duas, tudo bem que ele devia dinheiro, mas só entregou a fazenda porque o estado exigiu, ele só entregou a fazenda porque não podia ficar com as duas fazendas realmente ele devia um dinheiro, mas aí optou por lá, ali onde mora o filho Zé de Bentiví ali na estrada que desce para a Quixabeirinha, lá no Tanque Novo pro lado de cá é terreno do estado no caso era! Ali onde é o terreno do finado Edgar, a minha roça que chamamos de Estado o lado direito da estrada que desce para a Quixabeirinha pertencia ao Estado e essa estrada que desce para o Tiósque não existia, aí existia um corredor Essa eu lembro bem a gente (os índios) saíam da caatinga e caíam nessa estradinha que chamavam de trilha, depois foi que ampliaram e começaram a passar carros ali para a Melancia, mas antes tudo era por lá. A fazenda era grande, mas depois foram dividindo em pedaços e o governo do estado foi dando posses para cada um."

1. Ato de envelhecer documento para obter privilégios de forma ilícita.
2. Jargão muito utilizado na região norte/nordeste da Bahia para designar que algo não tem jeito.
3. Gazeta, um periódico, usualmente em formato de tablóide, especializado em algum tema específico. Informativo de grande circulação no período do Brasil colonial.
           4. O gambá-de-orelha-preta, saruê ou sarué (Didelphis aurita) é uma espécie de gambá que habita o Brasil, Argentina e Paraguai. Podendo atingir 60 a 90 centímetros de comprimento e pesa até 1,6 kg, alimenta-se praticamente de tudo o que encontra: insetos, larvas, frutas, pequenos roedores, ovos, cobras, escorpiões, etc.

Texto: Professor André Almeida, 2020

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